segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A Borboleta Amarela

Jorge Adelar Finatto


"Eu vinha sem raiva nem desejo - no fundo do coração as feridas mal cicatrizadas, e a esperança humilde como ave doméstica - eu vinha como um homem que vem e vai, e já teve noites de tormenta e madrugadas de seda, e dias vividos com todos os nervos e com toda a alma, e charnecas de tédio atravessadas com a longa paciência dos pobres - eu vinha como um homem que faz parte da sua cidade, e é menos um homem que um transeunte, e me sentia como aquele que se vê nos cartões postais, de longe, dobrando uma esquina - eu vinha como um elemento altamente banal, de paletó e gravata, integrado no horário coletivo, acertando o relógio do meu pulso pelo grande relógio da estrada de ferro central do meu país, acertando a batida do meu pulso pelo ritmo da faina quotidiana - eu vinha, portanto, extremamente sem importância (...)"
 
                        Rubem Braga, trecho da crônica Visão, Rio, novembro, 1952.*



photo: j.finatto
Não sei há quanto tempo não pegava este livro na estante. Fazia certamente muitos anos.
 
Subi na escadinha na altura dos autores de letra b. Lá estava, vertical e querendo ser folheado outra vez, A Borboleta Amarela, de Rubem Braga. 
 
Um livro bonito a começar pelo título. A bela capa branca silenciosa com o desenho da borboleta. A contracapa amarela com o título em letras vermelhas.
 
A folha de rosto tem uma assinatura com caneta esferográfica azul, mas foi toda riscada. Provavelmente ao vender o livro para o sebo, o anterior proprietário riscou seu nome. Ou foi o próprio dono do sebo, sei lá. Imagino que é triste se desfazer de um livro de que se gosta. E há uma data assinalada perto do nome: 1969, mesmo ano da edição.
 
No interior da orelha, meu nome e o ano em que adquiri o livro: 1977. Eu era então bem pobre e não comprava livros sem sacrifício, mesmo com o preço barateado do sebo.

No sábado foi o aniversário de 100 anos de nascimento de Rubem Braga (12 de janeiro de 1913 - 19 de dezembro de 1990), um dos grandes cronistas brasileiros.

Reli algumas crônicas da Borboleta. São textos publicados entre janeiro de 1950 e dezembro de 1952 no Correio da Manhã e em outros jornais. Anos antes, durante a Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945), o escritor fez a cobertura da participação da Força Expedicionária Brasileira no conflito.

Parece que foram escritos para a edição de hoje do jornal, estão ainda frescos e macios esses textos do velho Rubem. Um senhor livro.
 
Valeu a pena cada centavo que investi nesse e em outros livros. Eles foram para mim fonte de beleza, esperança e talvez salvação (quando não se tem quase nada, um bom livro faz uma grande diferença) .

A poesia dessa Borboleta Amarela, tanto tempo depois, ainda voa com graça e encanto pelo jardim da estante.
 
 ________________

*A Borboleta Amarela, crônicas. Rubem Braga. Editora Sabiá, 4ª edição, Rio de Janeiro, 1969.
Leia excelente artigo de Augusto Massi, na Folha de São Paulo:
Rubem Braga entre Sartre, Matisse e Breton
http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/1213565-rubem-braga-entre-sartre-matisse-e-breton.shtml
 

domingo, 13 de janeiro de 2013

Série Retratos 4 (Le champ de blé aux corbeaux)



photo: j.finatto



photo: j.finatto



photo: j.finatto


 ___________
 
Autor das photos: Jorge A. Finatto
Parte alta de Auvers-sur-Oise, cidade próxima de Paris, onde Van Gogh (1853 - 1890) pintou, entre outros, o célebre Campo de trigo com corvos. No mesmo local, provavelmente, disparou o tiro no abdômen, que causou sua morte dois dias depois. Uma outra versão diz que o disparo foi feito por outra pessoa.
O último quarto de Van Gogh:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2009/12/o-ultimo-quarto-de-van-gogh.html
Pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail j.finatto@terra.com.br
As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais. 
 
 

sábado, 12 de janeiro de 2013

Virgílio fugindo da treva

Jorge Adelar Finatto 


photo: j.finatto. Passo dos Ausentes

 
Então houve quem falou: ah, esse não vinga, semente ruinzinha. Tem jeito de gente abandonada no olhar. Está de malas prontas pras brumas do mundo.

Pobre virgílio viajando nas páginas iletradas da vida. Tão moço, tão sem amanhã. As contumélias da existência afloram ao nascer do sol e vão até a noite. virgílio sem eira nem beira. Amargança das horas. Ser da palavra inventada.

Esperançoso virgílio (assim minúsculo, pequeno) com terninho preto curto, botina marrom, a magra mala na estação. Espera o trem noturno na estação. O último abraço de Juan Niebla, o cego tocador de bandoneón.

A palavra cálida do ceguinho no ouvido:

- Vai com Deus, meu filho, vai com Deus. Não desespere. Eu vou rezar. Não se esqueça de voltar. Eu vou esperar você aqui.
 
Viver são as partilhas, não importa quão escuro.

A lágrima morna, coração saltando pela boca. virgílio.

Os oráculos da merda falaram deveras as coisas que disseram: esse não volta, dele é o círio que queima ligeirinho no breve da vida. Vai-se ao fundo.

Quem sabe o quê, nessa quirera? Quem aposta um caco nas patas do destino?

virgílio foi-se pelas estradas sombrosas, rasgou o breu. Habitou o deserto, o deserto sem fundo de cada esquina ventosa. O deserto dos quartos tristes e das ruas nojentas da cidade grande.

Nas horas do estúrdio, sentado no banco da pracinha, comeu bolacha de água e sal, bebeu água de torneira pública na concha da mão. Com a pequena rede invisível, deitado no banco da praça, pescava estrelas antes de dormir.
 
Tem gente com medo de trovão. Outros temem a neblina espalhando calada.

Ele tem medo do que está do outro lado do espelho. Receia um dia olhar e não divulgar ninguém. Nem rosto nem mão nem nada.

Espelho cego. Irredutível ausência. (A lembrança de Juan Niebla na estação.)
  
O mundo é um baita invento, pensa virgílio. Só que a pessoa é muito sozinha.

(Saudade do cheiro da flor de manacá na estação de trem abandonada de Passo dos Ausentes. Saudade, saudades.)
 
O tempo passou. virgílio não se matou. Nem foi engolido pela boca do esgoto. Fez um caminho desesperado, inesperado, tanta luz cultivou no labirinto. Acendeu-se. Sobreviveu nas quebradas da city, emergiu da sua ausência.

virgílio plantou a árvore do sonho na cabeça, os galhos cresceram para dentro da realidade.

Os gerânios deflagram lilases e rosas na janela do bardo da palavra reconstruída.

A escuridão ficou lá atrás, atrozes dias.
 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Série Retratos 3

  

 

 
_________________

Autor da photo: Jorge A. Finatto
O último quarto de Van Gogh. Maison de Van Gogh. Auvers-sur-Oise, França.
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2009/12/o-ultimo-quarto-de-van-gogh.html
Pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail do blog
As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais. 
 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Série Retratos 2







_______________

Autor da photo: Jorge A. Finatto
Pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail j.finatto@terra.com.br
As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais. 
 

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Série Retratos 1


 
 



____________
Autor da imagem: Jorge A. Finatto
Pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail j.finatto@terra.com.br
As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais.  

Série Retratos

Jorge Adelar Finatto

A partir de hoje publico a Série Retratos
 
A novidade é que as fotos desta série não serão acompanhadas de texto. As imagens falarão por si. Um álbum de fotografias virtual, uma memorabilia do olhar.
 
Os pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail j.finatto@terra.com.br

As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais.