Um leitor pergunta-me, por e-mail, o que, afinal, um escritor genial como Balzac ia fazer no cemitério de Père-Lachaise em Paris. Refere-se ao post de ontem (
29/12/12), no qual escrevi que o grande romancista francês costumava freqüentar aquele lugar para meditar e realizar no local o que denominou "estudos de dor".
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photo: j.finatto.Túmulo de Proust com carta e vaso de flor |
Admirou-se, também, o raro leitor, pelo fato de eu ter passado um dia - um domingo - pesquisando, anotando e fotografando no tal cemitério: "O que pode haver de tão interessante num lugar assim? Não revelará esse gesto certa tendência mórbida do temperamento do cronista?", arrematou.
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photo: j.finatto. Túmulo de Oscar Wilde em reforma, acima e em baixo (e os beijinhos) |
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photo: j.finatto |
Não posso falar por Balzac, mas acredito que, atento observador como era, capaz de ir a minudências que passam despercebidas da maior parte dos mortais, as horas vividas no cemitério serviram-lhe de precioso material existencial e reflexivo para escrever sua obra.
Nada como a morte para chamar-nos à vida.
Uma certa melancolia ancestral habita o meu sangue, admito. Esse é um traço anímico de quem nasceu em Passo dos Ausentes como eu. Ninguém vem ao mundo impunemente aqui nos Campos de Cima do Esquecimento, entre gélidas névoas.
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photo: j.finatto. Túmulo de Balzac |
Mas ainda não chego ao ponto de fazer excursões a cemitérios por causa disso. Longe de mim! A morte é, entre os fatos naturais, o que me causa maior aversão e desgosto. Não existe entre mim e ela amizade ou encantamento possível.
Visitar cemitérios, portanto, não é um passeio que, de regra, me agrade, pelo contrário. Além disso, procuro sempre evitar tais visitas, pois, como diz aquele sábio ditado popular: "quem não é visto não é lembrado".
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photo: j.finatto. Túmulo da escritora Colette |
Uma visita ao Père-Lachaise tem valor cultural. É um giro pela história da arte e da cultura. E uma visão impressionante da transitoriedade de tudo nesse mundo. O destino final de todos os esforços, caprichos, alegrias, dores, sacrifícios, preocupações e vaidades.
Ali estão os túmulos de alguns dos principais artistas, escritores, filósofos e cientistas que marcaram a trajetória humana. As inscrições tumulares dão alguma notícia do que fizeram. Na portaria, o interessado pode pegar um impresso com o mapa das sepulturas contendo informações sobre os ilustres falecidos.
Também é possível observar a reação das pessoas diante da morte de personagens famosos (e outros nem tanto, os estudos de dor, de que nos fala Balzac). Cartas, bilhetes, livros, flores, velas, objetos diversos são colocados nos túmulos.
Mas nenhum dos habitantes do Père-Lachaise é alvo de tamanha manifestação de afeto como Oscar Wilde, cujo túmulo foi coberto por marcas de beijos com batom ao longo do tempo. Sobre o assunto escrevi
Oscar Wilde: o beijo proibido.*
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photo: j.finatto. Père-Lachaise |
Estão também sepultados no Père-Lachaise, entre outros: Chopin, Édith Piaf, Yves Montand, Proust, Jim Morrison, Paul Éluard, Sarah Bernhardt, Maria Callas, Isadora Duncan, Allan Kardec, Camus, Molière, Champollion, Modigliani, Pissarro, Dalacroix, Max Ernst e por aí vai. É um panteão a céu aberto. Vale a pena uma visita.
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photo: j.finatto. Père-Lachaise |